CAZUZA: UM CRIATIVO
Cazuza – o tempo não pára é um drama o qual tem a direção de Sandra Werneck e Walter Carvalho e atuações de Marieta Severo, Reginaldo Faria, Emílio de Mello e Daniel de Oliveira.
No presente texto pretende-se fazer uma correlação entre alguns capítulos de um livro e cenas e diálogos do filme. O livro é Criatividade e grupos criativos, de Domenico De Masi, editado pela Sextante.
Domenico De Masi, com base nas idéias do psicanalista Hillman, tenta responder à seguinte questão: “Quais são as idéias, as fantasias, as metáforas, os símbolos e as noções que temos da criatividade e dos criativos?” Diz ele: “Uma (...) idéia liga a criatividade à forma, à excelência, ao sucesso, e caracteriza o criativo na pessoa ambiciosa que subordina o interior e o privado ao exterior e ao público, ficando vítima da sua própria imagem mítica, da qual não pode mais fugir.” Percebemos isto no filme Cazuza na cena em que o personagem principal assusta-se com a própria fama, afirmando que está acontecendo tudo o que ele queria (“manchetes”, “aplausos”), e diz à sua mãe, Lucinha: “Tô sempre querendo alguma coisa... Se não tiver mais nada para querer... O quê que vai ser depois disso tudo?”
Em Criatividade e Grupos Criativos, recorrendo-se a um estudioso, profere-se o seguinte: “Murray escreveu que o criativo ‘deve experimentar um certo gosto pelo caos temporário’: o caos interior, devido ao turbilhão de idéias, dúvidas, exaltações e desencorajamentos; o caos exterior, devido às condições econômicas, aos relacionamentos interpessoais, aos conflitos da solidariedade; o caos da sorte e da desgraça, devido à alternância com que a natureza privilegia ou caprichosamente abandona os criativos”.
Este caos, este vaivém de que se fala é a tônica da vida do personagem Cazuza. Exemplos não faltam: cena em que o grupo de rock Barão Vermelho se impressiona com a performance de Cazuza; os constantes conflitos pessoais e profissionais devido ao fato de Cazuza não querer se subordinar a ninguém, nem ao grupo Barão Vermelho, nem aos pais, nem ao namorado; cena na qual Cazuza ameaça tocar fogo em gasolina próxima de seu corpo caso sua mãe não lhe dê um abraço; o Barão Vermelho pára de tocar porque Cazuza não está cantando corretamente; num ensaio do Barão, Cazuza insiste em ensaiar uma música do sambista Cartola, provocando divergências e posteriormente uma violenta discussão.
Há também o momento em que o cantor e compositor considerado um poeta da canção demonstra insatisfações em fazer parte de um grupo de rock e, após quebrar uma premiação referente a cem mil cópias vendidas do disco do Barão Vermelho, fala bem emotivamente a um amigo e colega de trabalho: “Aí é que tá Zeca, eu não sei se eu tô dizendo o que penso, cara... eu só sei que não tô dizendo o que quero. Eu gosto de bagunça, cara, bagunça! Eu gosto é de bagunçar! Eu quero é misturar, Zeca, misturar! Fazer coisa diferente, p...! Eu só acho que pra fazer do meu jeito... eu tenho que fazer sozinho, Zeca.”
Ainda existem exemplos do caos supracitado: o personagem Cazuza fala sobre a AIDS: “Essa doença é uma m...! Não querem que a gente seja feliz...!” E, após descobrir que tinha AIDS, o autor de “Ideologia” pensa no suicídio. Há a cena na qual o pai de Cazuza, João, diz que os amigos de seu filho não prestam. Prontamente, Cazuza rebate: “Nessa vida ninguém presta! Os meus amigos não prestam, eu não presto!... Você não presta.”
Em Cazuza – o tempo não pára temos a oportunidade de conhecer as canções de um dos maiores criativos da música brasileira. Canções estas as quais, diga-se de passagem, são carregadas de atitude e poesia.
É importante frisar que a criatividade do personagem Cazuza não estava limitada aos aspectos profissionais, estendendo-se à vida pessoal. Isto dá brecha para que se analise o filme com base em diversas teorias psicológicas, além do que foi aqui analisado. Prova disso é a euforia de Cazuza ao versar sobre o ato de cantar: “Cantando a gente inventa, inventa um romance, uma saudade, uma mentira. Cantando a gente faz história. Foi gritando que eu aprendi a cantar. Sem nenhum pudor, sem pecado. Canto pra espantar os demônios, pra juntar os amigos, pra sentir o mundo, pra seduzir a vida.”
Comentários
Eu adoro algumas letras de Cazuza, e a sua criatividade.Mas contesto sua atitude, sua mãe! Depois comento mais.
Eu adoro esse filme, adoro Cazuza e adorei sua resenha.
Grande beijo
Ah... to te devendo uma vista no Mandala ás sextas... se cuida!!!
Muito boa a relação que você traz com os traços de Cazuza demonstrados no filme.
Musicalmente falando, a carreira solo dele foi bem mais politizada do que na época do Barão.
Tudo. Porque é Cazuza!
Parabéns pelos escritos, todos, Salomão!
Mas, Cazuza foi um poeta que deu asas as palavras não só ao falar de amor, tinha seu lado político questionador, afinal como ele mesmo cantava a que “Burguesia fede, enquanto houver burguesia não vai haver poesia.”
O que mais me atraiu no filme é a pressa e a necessidade de viver intensamente do protagonista, me perguntei após assistir o filme: Vale viver mais ou viver menos da maneira que achar melhor?
Meu querido, poeta questionador do conservadorismo e porra-louca...
Nossos inimigos ainda estão no poder
beijooos
Abração!
Muito massa, Sal!
O Agenor é um estouro talentoso que não se repetirá na música brasileira – até porque já não há época para isso; os inimigos ainda estão no poder. Uma dica apenas: não morra de overdose, meu herói!
Brincadeiras à parte, adoro seu talento e ele merece todo investimento.
Abraços.
Isolda.
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Veja no meu blog como funciona a brincadeira.